A Superintendência-Geral do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (SG/Cade) recomendou ao Tribunal da autarquia a condenação de 16 empresas e 52 pessoas físicas por formação de cartel em licitações públicas de trens e metrôs realizadas em São Paulo, Distrito Federal, Minas Gerais e Rio Grande do Sul. O despacho foi assinado no dia 11/12.
De acordo com o parecer da Superintendência, as provas colhidas ao longo da investigação permitiram concluir que empresas e funcionários interferiram no resultado de, pelo menos, 27 projetos relacionados a procedimentos licitatórios. Os participantes dividiram licitações e combinaram valores das propostas comerciais a serem apresentadas nos certames. A implementação das estratégias anticompetitivas teria incluído, por exemplo, institutos formalmente legais, como a formação de consórcio e a subcontratação, para dar uma aparência de competição ao cartel.
As companhias acusadas no processo são: Alstom Brasil Energia; Balfour Beatty Rail Power Systemsn Brasil; Bombardier Transportation Brasil; CAF Brasil Indústria e Comércio; MGE Equipamentos e Serviços Rodoviários; Hyundai-Rotem Brasil Indústria e Comércio de Trens; IESA Projetos Equipamentos e Montagens; Mitsui & Co Brasil; MPE – Montagens e Projetos Especiais; Procint Projetos e Consultoria Internacional; Serveng-Civilsan – Empresas Associadas de Engenharia; TC/BR Tecnologia e Consultoria Brasileira; Trans Sistemas de Transportes; Empresa Tejofran de Saneamento e Serviços; Temoinsa do Brasil; e Lucy Elisabete Pereira Teixeira (representando Constech Assessoria e Consultoria Internacional).
A investigação teve início em maio de 2013, a partir da assinatura de acordo de leniência celebrado entre Siemens, SG/Cade, Ministério Público Federal e Ministério Público do Estado de São Paulo. Com base nos indícios apresentados, o Cade obteve autorização judicial para realizar, em julho do mesmo ano, operação de busca e apreensão na sede de empresas suspeitas de participarem do cartel.
A análise do material apreendido (mais de 30 terabytes de dados eletrônicos e documentos físicos) resultou na instauração do processo administrativo.
Com a conclusão da investigação pela SG/Cade, o caso segue para análise do Tribunal da autarquia, responsável pela decisão final. Caso sejam condenadas, as empresas poderão pagar multas de até 20% do valor de seu faturamento bruto. Já as pessoas físicas ficam sujeitas a multas de R$ 50 mil a R$ 2 bilhões.
Linha 5 – Metrô de São Paulo
Os contatos ilícitos tiveram início em 1998, por ocasião do processo licitatório referente ao projeto da Linha 5 do Metrô de São Paulo. Na época, as empresas Siemens, Siemens AG, Alstom, Alstom Transport, DaimlerChrysler (atualmente Bombardier), CAF, Mitsui e TTrans teriam combinado dividir o escopo da licitação.
Manutenção de trens da CPTM
No início dos anos 2000, os acordos anticompetitivos se expandiram para as licitações referente aos projetos da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) para manutenção dos trens das Séries 2000, 3000 e 2100. Esses projetos teriam sido divididos entre os participantes do conluio.
Segundo a investigação, a Série 2000 foi alocada ao Consórcio Cobraman (formado por Alstom, Bombardier e CAF). Já a Série 3000 foi destinada à Siemens e a Série 2100 ao consórcio Alstom e CAF, que subcontrataria as empresas Bombardier, Temoinsa e Mitsui. Também teriam participado desse acordo as empresas Tejofran e TTrans.
Nos anos 2007 e 2008, ocorreu outra rodada de negociações entre as empresas para dividir o objeto de novas licitações realizadas pela CPTM para contratação de serviços de manutenção dos trens das Séries 2000, 3000 e 2100. Teriam participado do acordo Alstom, Bombardier, CAF, Siemens, Temoinsa, Tejofran, TTrans, além de MPE e MGE.
Da mesma forma, entre os anos 2011 e 2013 Alstom, Bombardier, CAF, Siemens, Temoinsa, Tejofran, TTrans, MPE e MGE supostamente se reuniram novamente para dividir licitações realizada pela CPTM. Dessa vez para manutenção dos trens das Séries 2070, 7000, 7500 e 9000, além de 2000, 3000, 2100.
As empresas Alstom, MGE, CAF, Bombardier, Siemens, Tejofran e Mitsui também teriam estabelecido contatos para eliminar a competição do projeto de aquisição e manutenção de trens da Série 5000 da CPTM, em 2009. O ajuste era destinado à formação de um acordo global entre os três grupos interessados em participar da licitação: Bombardier, Siemens, Tejofran e Mitsui; CAF; e Alstom e MGE.
Linha 2 – Metrô de São Paulo
Em 2005, as empresas Alstom, Siemens, TTrans, Bombardier e Balfour Beatty supostamente mantiveram contatos que afetaram a concorrência da licitação referente ao projeto de extensão da Linha 2 do Metrô de São Paulo.
O acordo celebrado entre as envolvidas no cartel previa que dois consórcios seriam formados para dividir o objeto do certame. O Consórcio Linha Verde (Alstom e Siemens) seria o vencedor, enquanto o Consórcio Linha Dois (Bombardier, Balfour Beatty e TTrans) apresentaria uma proposta perdedora para, posteriormente, ser subcontratado.
Projeto Boa Viagem – CPTM
Entre 2004 e 2005, as empresas Alstom, IESA, MGE, Bombardier, Siemens, TTrans, Tejofran e MPE teriam realizado vários contatos com o objetivo de dividir os lotes da licitação do projeto Boa Viagem da CPTM. O certame tinha como objetos a execução de serviços voltados à expansão da malha, manutenção de vias, melhorias nos sistemas fixos de vias e de alimentação e à revitalização do material rodante.
Aquisição de carros – CPTM
No período de 2007 a 2008, quando foram realizadas as licitações dos projetos da CPTM para aquisição de 320 carros e de 64 carros, teriam participado dos acordos anticompetitivos Alstom, Siemens, Mitsui e Hyundai. As empresas supostamente combinaram que o consórcio Alstom-Mitsui-Hyundai seria o vencedor da licitação dos 320 carros e que a Siemens seria a vencedora da licitação dos 64 carros. Em ambos os contratos, os vencedores subcontratariam as outras empresas participantes do cartel para fornecimento de materiais.
Linhas 1 e 3 – Metrô de São Paulo
Entre 2008 e 2009, foi apurado que as dez empresas participantes das licitações para reformas das Linhas 1 e 3 do Metrô de São Paulo dividiram entre si o escopo dos projetos: Alstom, Siemens, Bombardier, Tejofran, MGE, TTrans, Temoinsa, IESA, MPE e CAF.
Manutenção de trens – Metrô DF
No projeto de manutenção da Companhia do Metropolitano do Distrito Federal (Metrô DF), realizado em 2005, também teriam sido mantidos contatos que resultaram em um acordo entre o Consórcio Metrô Planalto (Alstom, IESA e TC/BR) e o Consórcio Metroman (Siemens e Serveng). O objetivo era dividir o escopo do projeto por meio da subcontratação do consórcio perdedor pelo consórcio vencedor (52% do volume total para o Consórcio Metrô Planalto e 48% para o Consórcio Metroman).
As empresas também supostamente acordaram que os preços a serem apresentados na licitação deveriam corresponder a 94,5% e 95% do valor estipulado pelo Metrô DF, de acordo com sorteio realizado pelos consórcios.
Além disso, após a fase de pré-qualificação, a Siemens teria realizado negociações com a empresa MPE para que ela retirasse recurso administrativo apresentado contra decisão do Metrô DF, que havia desqualificado o consórcio do qual a MPE fazia parte. Em troca, a MPE ganharia parte do escopo do projeto, como subcontratada do Consórcio Siemens ou Metroman.
Já a empresa MGE teria participado desse conluio sendo subcontratada pela Siemens como recompensa pelo auxílio prestado na contratação de funcionários necessários para que a própria Siemens ganhasse o certame.
Aquisição de trens – CBTU e Trensurb
Em 2012, CAF e Alstom supostamente mantiveram contatos que resultaram na divisão das licitações promovidas pela Empresa de Trens Urbanos (Trensurb) e pela Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU), destinadas à aquisição de trens para os metrôs de Porto Alegre e Belo Horizonte, respectivamente.
Em razão desse acordo, as empresas participaram das licitações como um consórcio e definiram que a CAF ficaria com a maior parte do projeto da CBTU. Já em relação ao certame da Trensurb, as empresas combinaram que a maior parcela de realização do projeto ficaria com a Alstom.