Os presidentes das federações das Indústrias de Alagoas (Fiea), da Paraíba (Fiep) e de Pernambuco (Fiepe) foram presos hoje (19) em Brasília. José Carlos Lyra de Andrade (Alagoas), Francisco de Assis Benevides Gadelha (Paraíba) e Ricardo Essinger (Pernambuco) são alvo da Operação Fantoche, deflagrada pela Polícia Federal (PF), em parceria com o Tribunal de Contas da União (TCU).
Na mesma operação, foi preso o presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Robson Andrade, além de seis investigados cujos nomes ainda não foram confirmados. Todos os 10, detidos em caráter temporário, são suspeitos de integrar uma organização criminosa acusada de fraudar convênios do Ministério do Turismo com entidades do Sistema S (Sesi, Senai, Sesc, Sebrae).
Além dos 10 mandados de prisão temporária, 40 mandados de busca e apreensão autorizados pela 4ª Vara Federal da Seção Judiciária de Pernambuco estão sendo cumpridos nos estados de Pernambuco, Minas Gerais, São Paulo, da Paraíba, de Mato Grosso do Sul e Alagoas e no Distrito Federal.
Robson Andrade, Lyra de Andrade, Gadelha e Essinger foram detidos em Brasília, onde participariam da reunião mensal da CNI. Em notas, cuja redação é idêntica, a CNI e as federações afirmam que os dirigentes das entidades estão prestando depoimento à PF, na capital federal.
A Federação das Indústrias de Pernambuco diz ainda que todos os convênios assinados pela entidade “atendem, criteriosamente, às exigências licitatórias previstas em lei” e que está à disposição para colaborar com as autoridades responsáveis pela investigação. A Federação das Indústrias de Alagoas argumenta que não teve acesso à investigação e afirma acreditar que “tudo será esclarecido”.
De acordo com a PF, o grupo atua desde 2002 e pode já ter movimentado mais de R$ 400 milhões. O dinheiro era movimentado por meio de contratos e convênios que entidades de direito privado, sem fins lucrativos, assinavam com o Ministério do Turismo e com unidades do Sistema S. A maior parte dos contratos previa a execução de eventos culturais e de publicidade. Superfaturados, não eram integralmente executados e os valores desviados eram destinados a empresas controlados por uma mesma família – cujo nome não foi revelado.
Em nota, o Ministério do Turismo informou que já tinha determinado uma auditoria completa em todos os instrumentos de repasse antes mesmo de tomar conhecimento da investigação da PF. A auditagem resultou no cancelamento de um contrato no valor de R$ 1 milhão.
“O Ministério do Turismo, que não é alvo das buscas e apreensões da Operação Fantoche, está totalmente à disposição para colaborar com a investigação”, diz a pasta, destacando não ter firmado nenhum novo convênio este ano. “Todos os convênios investigados pela Polícia Federal são das gestões dos presidentes petistas Lula e Dilma Rousseff”, diz o texto.
Leis sobre prestação de contas do Sistema S são frágeis, diz delegada
A delegada da Polícia Federal (PF), Heloisa Albuquerque, disse haver uma “fragilidade” na legislação que trata da prestação de contas pelas chamadas paraestatais – entidades que prestam serviços de interesse público sem integrar a estrutura da Administração Pública, a exemplo das instituições sociais que integram o chamado Sistema S (Sesi, Senai, Sesc, Senac, Sebrae, Senar, Sescoop, Sest, Senat).
“Uma destas fragilidades é o fato de tudo ser feito com base em atos declaratórios”, disse a delegada ao detalhar a jornalistas os indícios que levaram a decretação da prisão temporária do presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Robson Andrade, e das federações das Indústrias de Alagoas (Fiea), da Paraíba (Fiep) e de Pernambuco (Fiepe).
Responsável por conduzir as investigações que apuram as suspeitas de fraudes em convênios do Ministério do Turismo com entidades do Sistema S, a delegada federal disse que, embora obrigadas a prestar contas da forma como gastam os recursos públicos provenientes de contribuições compulsória, as entidades paraestatais não estão sujeitas ao mesmo rigor da Administração Pública Direta ou Indireta.
“No caso do Sistema S, a obrigatoriedade que existe é, meramente, apresentar um relatório de gestão. O setor público tem o Siafi [Sistema Integrado de Administração Financeira], onde todo pagamento é registrado e os órgãos de controle têm acesso. No caso do Sistema S não. Eles têm um sistema próprio que eles próprios alimentam. Não há, portanto, a possibilidade de um órgão de controle fazer uma auditoria”, explicou a delegada.
Prejuízo potencial
Segundo Heloisa, em virtude desses fatos, os investigadores ainda não sabem o potencial prejuízo causado pelo suposto esquema investigada pela Operação Fantoche. A estimativa é que ao menos R$ 40 milhões foram desviados a partir de 2002. Os principais elementos probatórios, até o momento, são as notas fiscais apresentadas pelas empresas sob investigação, a movimentação financeira dos envolvidos e diligências de campo que, de acordo com a delegada, indicam que parte das empresas subcontratadas não passam de empreendimentos fantasmas.
“Muitos documentos nós ainda não conseguimos obter. Daí a importância das buscas [de documentos feitas hoje]. Será importante analisar a documentação apreendida hoje para calcularmos os reais prejuízos”, disse Heloisa Albuquerque, insistindo em classificar a situação como “uma fragilidade” não levada em conta quando a legislação das paraestatais foi elaborada.
Participação das Oscip
De acordo com a delegada, outra dificuldade para as investigações é a participação de organizações da sociedade civil de interesse público (Oscip) no suposto esquema. De acordo com a PF, o grupo investigado fraudava convênios para a realização de eventos culturais que o Ministério do Turismo assinava com as unidades do Sistema S por meio de Oscips. Heloisa disse que estas organizações “têm mais flexibilidade para ser contratadas” e, por isso, serviam de fachada para o grupo de empresas controladas por uma mesma família e que são o principal alvo das investigações.
A delegada explicou que estas organizações ficavam com entre 2% e 10% do valor total do convênio e, em alguns casos, pagavam alguns serviços contratados de empresas idôneas que não tinham conhecimento do esquema. Os valores restantes eram repassados para os idealizadores do esquema.
“Os entes do Terceiro Setor não são obrigados a licitar. Eles têm que fazer uma cotação de preços – neste caso, nem isso era feito. Legalmente, eles não têm o dever legal de licitar e, portanto, não estão submetidos à Lei de Licitações”, disse a delegada, acrescentando que, em alguns casos, licitações foram realizadas apenas para dar “um aspecto de lisura” a práticas ilícitas. “Observamos tratar-se de uma falsa concorrência.”
CidadeMarketing com informações da EBC.