09Não é novidade alguma o fato de que as redes sociais digitais deram voz aos indivíduos. Todo ser humano pode hoje, virtualmente, falar o que quiser e de diversas maneiras. Por um lado isso é excelente, pois dá vazão à liberdade de expressão. Por outro lado isso pode ser terrível, porque infelizmente, muitas vezes, a liberdade é confundida com libertinagem!
A liberdade está intimamente associada à responsabilidade. Não se pode ser verdadeiramente livre sem assumir a responsabilidade decorrente dessa liberdade. E de todas as liberdades que podemos ter, acredito que a liberdade de expressão é a que mais revela uma pessoa – seu pensamento, seu caráter, suas atitudes, sua educação, seu coração. Tem uma frase que gosto muito, que diz:
“Não há nada que melhor defina uma pessoa do que aquilo que ela faz quando tem toda a liberdade de escolha.” — William M. Bulger
Pois bem, agora as tecnologias digitais interativas deram às pessoas a liberdade pra escolher o que falar, como falar e onde falar, à vontade. As pessoas ganharam voz, indubitavelmente. Mas ter voz não é suficiente para se construir uma comunidade de livre expressão, é preciso aprender a falar. Falar, no contexto social, de alguma forma está sempre ligado a se relacionar, e relacionamento envolve ética. Será que estamos esquecendo ou será que não aprendemos ética? Isso mesmo, ética – a palavra mais importante no relacionamento humano. Desde a antiguidade, a preocupação ética sobre o que se fala é tratada em textos, contos, histórias.
A palavra tem poder tanto para construir com para destruir. O famoso texto “As Três Peneiras”, atribuído a Sócrates, recomenda que qualquer assunto antes de ser falado deva passar pelas peneiras (filtros) da verdade, a bondade e a necessidade. Acredito que as duas últimas peneiras (bondade e necessidade) estão sujeitas ao entendimento de cada coração e de cada mente. No entanto, a primeira peneira não é primeira à toa – a verdade é a responsabilidade da liberdade de expressão. Ela está sujeita à lei, sim, mas acima de tudo, falar algo que não é verdade e que afete alguém é anti-ético. E isso, nas relações humanas, é mais importante do que a lei em si.
No paradigma das mídias tradicionais, apenas alguns têm voz e o poder de falar. Já no paradigma das mídias sociais, todo mundo pode falar, quando, onde e como quiser, inclusive criticar. As pessoas criticam muito e isso faz parte da natureza humana. Veja a quantidade de #FAIL que é dada a cada minuto no Twitter. Não que a crítica não seja uma coisa boa. Ela é! E muito importante para a melhoria de processos e pessoas.
Um #FAIL bem dado, baseado na verdade, é sempre uma oportunidade para se resolver problemas, para melhorar. Sempre digo que aprendi e me desenvolvi muito mais com críticas do que com elogios. Uma crítica bem feita pode ser também caminho para se alcançar a justiça. No entanto, uma crítica mentirosa, maldosa ou injusta, pode causar danos desastrosos. Uma crítica, para ser boa e positiva, precisa ser fundamentada, baseada na verdade – a primeira peneira de Sócrates. Se puder se basear também na bondade e utilidade, maior será o seu valor. No entanto, nesse coral de empossados de voz via mídias sociais, é triste ver a quantidade de pessoas que criticam com veemência, sem base verídica alguma, e muitas vezes também sem bondade e utilidade.
Penso que, se por um lado quem tem voz precisa falar com ética, por outro lado precisamos também aprender a ouvir, a afinar os ouvidos para validar a informação e saber a quem ouvir – ouvir com ética também. Creio que com o tempo, as pessoas aprenderão a discernir entre o que se deve ou não ser ouvido, acreditado. Esse processo servirá para auto-regular as redes sociais digitais, do mesmo modo que nos auto-regulamos nas redes sociais presenciais. Acredito na educação como base e solução para uma sociedade ética, e penso que o único modo de minimizar a avalanche crítica que entope de #fails descabidos e besteiras as mídias sociais, é educando. Já temos TECNOLOGIA 2.0, que nos deu VOZ 2.0. Precisamos de EDUCAÇÃO 2.0, que nos dê o FALAR 2.0 e OUVIR 2.0 de forma ÉTICA.
Apesar dos estragos causados nas mídias sociais devidos à falta de educação e ética, acredito que existe um lado muito interessante nesse processo: quando alguém se expressa livremente, está se revelando amplamente. Assim, o que se fala, pode depor a favor ou contra quem fala. Quando se age de forma antiética, não é apenas ao outro que se está atingindo, mas a si próprio – revelando o tipo de ser humano que se é realmente. Algumas vezes, uma pessoa que dá um #FAIL pode estar, na realidade, mostrando que #FAIL é ela. Fazendo uma analogia com a frase de Carrie Fisher, é como beber veneno e esperar que o outro morra.
Antes de escrever o próximo tweet, pense não apenas no assunto que ele diz, mas, principalmente, no que ele diz sobre você 😉